11.9.20

A Casa dos Espíritos - Isabel Allende | Resenha



*atenção: o livro pode conter gatilhos (violência, estupro, maus tratos a animais)*

Título: A Casa dos Espíritos

Autor(a): Isabel Allende

Título original: La casa de los espíritus

Tradutor(a): Carlos Martins Pereira

Editora: Bertrand Brasil

Ano: 2020

Número de páginas: 446

Edição: 49ª

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A Casa dos Espíritos é um romance escrito pela chilena Isabel Allende que atravessa gerações da faília Trueba. Ele não chega a especificar o país latino-americano em que se passa, mas consegue, por meio dos seus personagens, traçar um belíssimo panorama político-social da hispanoamérica, mesclando com elementos sobrenaturais e aderindo ao realismo fantástico, embora não seja apelativo.

É interessante ressaltar que as mulheres da narrativa apresentam uma certa continuidade no que diz respeito ao sobrenome: Nívea, Clara, Blanca, Alba. Achei interessante termos uma família continuada por mulheres que levem o mesmo nome, enquanto nega veementemente o desejo do patriarca de dar seu nome ao filho. 



O livro começa com Clara ainda criança, vivendo com sua irmã, a bela Rosa e sua mãe Nívea. Ela já demonstra sinais de clarividência desde a infância. Anos mais tarde, casa-se com Esteban Trueba (personagem mais asqueroso da face da Terra) e tem 3 filhos: Blanca e os gêmeos Jaime e Nicolás. 

Enquanto Clara é uma mulher fechada em sua própria mente, bondosa e mais preocupada com o sobrenatural que com coisas mundanas, Esteban é ambicioso e deseja a qualquer custo ter Clara por inteiro. Esteban veio de uma situação financeira mais complicada, enquanto Clara era de família rica.

Os poderes mentais de Clara não perturbavam ninguém e não provocavam maiores transtornos; manifestavam-se quase sempre em assuntos de pouca importância e na estrita intimidade do lar. (p.15)

Ao longo da narrativa vemos a família crescer e se envolver em tragédias (e também em cenas cômicas).Vemos Clara tentando a todo custo ajudar aos pobres e seu filho Jaime acaba puxando isso dela. Nisso, o belíssimo casarão vai se transformando num labirinto cheio de gente necessitada, ou querendo saber sobre o futuro. 

É até difícil contar linearmente sobre esse livro. Não sei bem o que falar sem soltar algum spoiler, mas também não quero ser rasa. É um livro grande, denso, mas que com um pouco de esfrço consegui ler as 446 páginas em menos de 1 semana pois tem uma narrativa que prende.

Mas aqui vemos muita oposição política, luta de classes, ironias da vida, tragédias familiares e muito drama que só um romance genuinamente latino pode oferecer. Tem um "quê" de novela das 6 com aquelas famílias enormes, fazendas e amores proibidos. Tem emoção e expectativa. Personagens secundários que merecem destaque porque desempenham papeis fundamentais. Sim, você vai gastar todos os seus post-its porque é cheio de passagens reflexivas.



Aliás, a escrita de Allende me lembrou muito a de Gabriel García Márquez (inclusive algumas cenas aqui descritas também). Ela vai dando "mini spoilers" no decorrer dos capítulos para depois detalhar melhor esses fatos. Apesar disso, seguem uma mínima ordem cronológica, intercalando a voz do narrador e a voz de Esteban Trueba, que reconta suas memórias. Em vários momentos o livro deixa evidente que Clara também tem o hábito de anotar suas memórias em "cadernos de anotar a vida" então o livro vai seguindo fatos da vida da matriarca da família. É interessante quando há conflitos entre esse narrador (que nos é revelado ao final) e a narrativa de Trueba porque ali fica claro que não há em nenhum momento, apesar da terceira pessoa, uma narrativa imparcial. 

O livro nos leva a crer que se passa no Chile, mas em momento algum isso é mencionado (inclusive fui checar a geografia em algumas passagens e isso confirmava a minha suspeita do livro se passar no Chile). Contudo, diversos países da América Latina passaram por períodos conturbados de recessão, seguidos de governos mais assistencialistas voltados para a esquerda e seguidos por ditaduras extremamente opressoras. Havia a descrição de um político conservador ali que podia muito bem estar caminhando pelas ruas de Brasília em pleno 2020. É para vermos como algumas coisas de fato mudaram pouco desde a década de 1960, aproximadamente. 

A Casa dos Espíritos apresenta personagens muito bem construídos, profundos e que sofrem diversas mudanças na narrativa. São complexos, e mesmo o odioso Esteban Trueba me causou pena em alguns momentos. É um livro que nos mostra diferentes versões de seres humanos. Diversas relações sociais, apesar de se passar no cerne de uma família abastada.



Contudo, não sei se é culpa da época em que foi escrito ou se é pensamento da autora, o livro apresenta frases machistas, racistas e gordofóbicas. Eu sei que foi escrito em um momento em que se discutia menos esses temas e que algumas palavras talvez sequer fossem consideradas ofensivas para a maioria dos leitores. Em algumas passagens, elas partem da boca de personagens (muitos deles agem e pensam de forma preconceituosa mesmo, então faz parte da construção do discurso -- para aumentar a sua raiva deles). Outro ponto que me incomodou foi a quantidade de maus tratos a animais. Percebi que isso vinha na forma de "retrato" (situações que provavelmente eram corriqueiras e a autora colocou ali, sem fazer nenhum juízo de valor). Mas me incomodaram. Suponho que fossem práticas comuns à época e ao local. Mas eu, leitora do meu local e época me senti incomodada. Também há cenas de estupros, torturas e violência física. Não com tantos detalhes. Mas já aproveito o parágrafo para explicar o aviso de gatilho do começo do post. 

Não acho que nenhum dos pontos abordados acima tenha prejudicado minha experiência de leitura. Mas não vou "passar pano". Não faço parte de nenhum grupo diretamente ofendido e talvez para essas pessoas isso possa causar algum gatilho. Então recomendo a cautela.

Excetuando-se isso, talvez tenha sido a melhor leitura de 2020, e também a melhor surpresa, porque eu tinha zero expectativas (aliás eu tinha um enorme preconceito com esse livro. Acreditava se tratar de um romance espírita, e não que eu tenha algo contra, mas nunca tive vontade de ler). É um livro arrebatador, você ri, chora, sente raiva, torce contra e pede por mais um capítulo. E depois que termina não para de pensar se os personagens ficaram bem. Entrou para os favoritos da vida, com certeza. Mais uma dádiva do Leia Mulheres Jundiaí. 

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Ilustração por Wokumy • Layout por