28.6.20

RESENHA: ORLANDO - VIRGINIA WOOLF



Hoje vim trazer a resenha do que talvez seja a melhor leitura de 2020. Orlando foi escrito por Virginia Woolf, autora que já elegi para ser a minha escritora favorita. E hoje, no dia do Orgulho LGBTQ+, nada mais justo que trazer a resenha de uma autora que não era heterossexual (nem monogâmica), embora tudo tenha sido por debaixo dos panos (até porque na Inglaterra era crime se relacionar com pessoas do mesmo sexo). E talvez essa seja uma das primeiras obras a abordar a transexualidade (data do início do século XX), ainda que não seja da forma como conversamos hoje, ela se utiliza de sutilezas e de um discurso muitas vezes mais sensato do que muitos mais modernos que o dela.
Título: Orlando: Uma biografia
Autor(a):  Virginia Woolf
Título original: Orlando: A Biography
Tradutor(a): Jorio Dauster
Editora: Penguin - Companhia das Letras
Ano: 2014
Número de páginas: 379



   

  

  Em Orlando, temos um protagonista aristocrático, jovem e belo, dono de uma grande propriedade rural na Inglaterra Elisabetana. 

    Após passar por uma grande desilusão amorosa, podemos perceber que para Orlando o tempo não passa igual para nós, reles mortais. Ele pode viver por séculos e conhecer vários reis da Inglaterra.
Não seria exagero dizer que saía depois do café da manhã com trinta anos e voltava para jantar com cinquenta e cinco. Algumas semanas acrescentavam um século à sua idade, outras não mais que três segundos. 

    Um dia, ele simplesmente acorda em corpo de mulher. E aí deixa de ser ELE para ser ELA. Deixa de ser Lord Orlando para ser Lady Orlando. Sim, ela mantém o nome original.
Para fazer alguns comentários, Orlando havia se transformado em mulher - isso é inegável. Mas, em todos os demais aspectos, continuava a ser precisamente como era antes. 

     que achei mais interessante foi a naturalidade como Orlando acordou no corpo oposto. Seu estranhamento passa a acontecer aos poucos, ao perceber que os direitos, as condições e até as diversões não podiam ser mais as mesmas.

    Ora, um corpo masculino não difere tanto assim de um feminino, salvo por algumas diferenças em órgãos genitais. O indivíduo que o habita pode ser o mesmo, independente de gênero. Se você acredita em alma, pode falar nisso. É claro que a personalidade ainda é influenciada pelo sexo biológico ao qual nascemos devido a nossa criação. Porque ainda hoje homens e mulheres nascem e são criados de formas diferentes, para agir distintamente.
Muitas pessoas, levando isso em conta e considerando que tal mudança de sexo é contrária à natureza, fizeram ingentes esforços para provar que (1) Orlando sempre fora mulher e (2) que Orlando naquele momento era homem. Deixemos que os biólogos e psicólogos decidam. Para nós, basta expressar o simples fato de que Orlando foi homem até os trinta anos, quando se transformou na mulher que continua a ser desde então.

    Ainda hoje criamos distinções fictícias entre ofícios e lazeres masculinos ou femininos (e é claro que nesse processo estamos ignorando completamente uma gama de pessoas que não são cis, ou que não se identificam com nenhum dos gêneros).

    E Orlando mostra lindamente o quanto de sua personalidade fora moldada pelas características sociais impostas ao seu gênero e o quanto isso vai sendo desconstruído enquanto ela descobre-se mulher. Em uma passagem, Orlando percebe que  as roupas e o porte físico que era imposto às mulheres, além de todo o ritual de beleza, atrapalhava o desempenho em atividades como cavalgar e correr. E Orlando percebe como dá trabalho se produzir toda, passar horas se maquiando, penteando e escolhendo roupas. Sendo que enquanto homem ele também cobrava isso das mulheres. 

    Além disso, a característica de passagem de tempo nos permite analisar essas mudanças no decorrer dos séculos. Se ao regressar ainda mulher à Inglaterra Orlando mal podia ser proprietária, em determinado momento, já contemporânea à escrita de Virgínia, ela pode dirigir um automóvel.

    Achei intrigante também a autora ter passado a maior parte do livro no reinado de duas das maiores rainhas que a Inglaterra já teve: Elisabeth I e Vitória. Me levou inclusive a refletir que detre tantos reis, as rainhas foram as monarcas mais notáveis, mais lembradas. 

    As palavras de Virgínia fluem lindamente. As descrições são quase cinematográficas. Percebi que há uma sintonia entre o meu fluxo de pensamentos e a forma como a autora coloca as palavras no papel. Talvez por isso eu não tenha me cansado nem um pouco e tenha terminado inclusive antes do tempo da leitura coletiva.

    Essa edição da Penguin possui notas de rodapé (o que no aplicativo do Kindle achei ruim de ler), prefácio e posfácio maravilhosos. Que apesar de darem spoiler (leiam depois, por favor) super contextualizam a obra e o romance de Virginia Woolf e Vita Sackville-West. Alás já quero ler aquele livro sobre as duas. 

    Não deixe de assistir o vídeo que deixei aqui em cima. Produzi com muito carinho! Eu estava morrendo de saudade das resenhas escritas aqui no blog, sem limites de caracteres. Me conte aqui embaixo se você prefere essas resenhas no YouTube, no Blog ou lá no Instagram!

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Ilustração por Wokumy • Layout por